31 de agosto de 2014

O Concreto e O Abstrato

Querido Pedro,
preciso confessar-te uma coisa: eu sonhei um sonho que a vida roubou de ti!


E eu preciso muito mesmo saber onde estás agora entre as estrelas, já que há noites em que procuro falar contigo, querido passado que nunca vivi e mesmo assim, tanto quero bem! Por onde andaste nos últimos anos além de nos desérticos pesadelos de nosso bem? Tu que foste o sonho realizado e vivido nos anos daquela juventude, por onde te perdeste no labirinto da eternidade a procura do olhar que contemplo agora? Nós dois sabemos que é ele a ponte que uniu para sempre nossos mundos nesse mundo, dessa vez... Mas eu agora começo acreditar que houve um tempo, muito distante, muito ausente desse presente, onde vivemos todos juntos alguma história muito grande, imensa e tão forte que precisariámos de mais essa chance para completá-la. Quando ao buscar-te entre o brilho dos corpos tão altos, clama meu peito um alento, um afago, o aconchego de um amor que tu deixaste para trás sem querer e meu amigo Pedro, é sorte minha o azar da tua morte? Deveras eu nunca encontraria aquela profundeza castanha de outras vidas se tu não tiveras sofrido e assim ido; isso pesa em mim tanto agora que ecrevo-te tão sinceramente. A tua partida foi minha chegada dentro de um coração, um oceâno abandonado como o de Netuno... E existe ali o navio naufragado nas profundezas de suas lágrimas que seco a cada dia e cerco em certas horas de alegria, em outras horas de paciência ou algumas (bem poucas) de tolerância, com amor e uma resiliência que acredito, vem-me de ti.

Acontece querido Pedro que eu quero sinceramente findar todas aquelas mágoas e cada dor que a tua ausência deixou, eu sofro e sozinho vejo-me o privilegiado entre nós dois. Então me questiono qual de nós aqui na terra encontrar-te-á na imensidão, algum dia, de alguma forma? Eu estremeço por dentro em meu dilema sobre esse encontro, pois estou certo que antes de tudo será um acerto de contas. Me desespero em pensar que poderá ser nosso amor comum quem o verá no fim de um corredor para luz e assim ao expandir junto contigo, esquecer-se-ia de mim e assim eu ficarei sozinho sem saber mais como viver e nem o verdadeiro motivo das coisas. Por outro lado, se encontrar-me diante de ti entre as portas e a luz, então o terei deixado e ele uma vez mais derramará sua vida em tristes prantos de uma solidão que já viveu, onde muito já perdeu, mas que sendo o forte coração que cuidou-te, amou-te e que a mim entregou-se, sobreviveu!
Amigo Pedro, onde estão as chaves que perderam-se quando tu te foste desse mundo? Onde está o mundo do qual ouvi primeiro falar e onde mora um brilho moderado dos castanhos olhos do nosso grande amor? Algo apagou-se ali e eu gostaria de saber se é possível ascender as velas sobre os castiçais do salão onde a valsa fora interrompida. Tu me entendes? Eu preciso provar ao nosso nobre coração que ele salvou-te, de todas as formas que um humano pode salvar a outro humano. Eu preciso provar que foi ele quem fez teus vinte e poucos anos serem os mais doces, os mais ternos, eternos dentro de ti. Ajuda-me e perdoa-me se o que te peço é amar o teu amor, o meu amor é teu então, agora sei que tu me amas como a ti eu também, obrigado!
Houve um dia, quando fui mais jovem, em que acreditei em tantas promessas. Nesse tempo as promessas machucavam-me quando eram mentiras descabidas, quando eram apenas mentiras. Houve um tempo em que as verdades não me interessavam nada, não me importavam, pois minha única preocupação era viver e viver, um dia e outro. Mas eu encontrei alguém que marcou-me a alma, e quando me lembro de suas poucas palavras, numa conversa informal, me emociono porque pensei que o queria todo para mim. Eu empolguei-me, lhe tive os beijos e os abraços, um louco amor entre os meus braços de uma noite cheia de estrelas... Tu já estavas aí mirando-nos, providenciando todo o encontro e como sabes, apaixonei-me e ao conter-me naquela despedida apenas quis saber como encontrá-lo depois. Foram dias emocionados que atravessei vagarosamente na espera desse novo encontro que nem certo ainda era, mas dentro de mim era e foi a alegria mais sublime ouvir a sua voz que me disse sim a cada convite, cada novo encontro que fizeram-me sangrar por dentro em um pacto silencioso com meus princípios e meus novos sentimentos. Ah, era ele um artista, um poeta, um admirável poliglota, encantador precoce pianista, uma jóia... Tua jóia, teu poeta, teu artista e eu sofri!
Pedro, meu amigo entre os astros, foste tu quem me escolheu? Foste tu naquela praia, numa brisa serena quando eu disse ao nosso bem se queria só mais uma vez estar comigo? E foste tu quem me soprou aos ouvidos que o buscasse e o amasse, que o acolhesse e fundo em seus olhos enxergasse o meu coração? Aos pouquinhos eu fui ganhando a conafiança e aos pouquinhos os presentes humanos que com ele vêm, os amigos, os companheiros de um trabalho lindo e os sentimentos de um artista sensacional. Eu imagino quantas vezes tu também te sentaste no escuro para ver suas criações sob a luz de um palco, mas suas personagens machucadas só existem agora, depois de ti... Eu também quero vê-lo sorrir da mesma forma como tu o viste!!
Meu caro confidente, eu me despeço e te peço apenas uma coisa, apenas essa: Volta!
Revive de alguma forma, sob alguma existência que nos faça saber que estás conosco outra vez, sê o sentimento entre nós ou uma conquista que devolva a felicidade completa do nosso amor; esteja conosco até que possamos estar distante daqui contigo, um dia, talvez... Volta, devolve o riso e o sorriso que tu mesmo percebeste mudar na alegria sempre contagiante do nosso bem e permite-me sentir a plenitude do que foram tu e ele, naqueles anos joviais. Eu o assumirei como tu nunca pudeste e eu enfrentarei todo esse mundo como tu eu sei que quiseste e inspira-o a seguir, a gerar e abrir novamente as cortinas de um palco de onde o mundo precisa vê-lo atuar e agir.


Por nosso orgulho, o nosso náufrago vencedor, teu mundo passado concreto e meu mundo futuro abstrato, nosso querido encontro de um doce e transcendente amor; eu te prometo nunca decepcionar-te a missão confiada de ser-lhe o amor que dele cuidará como também ele cuidou-te e salvou-te de tantas formas.



Sei que um dia nos encontraremos todos,

Edu.


- Existe um mundo
que eu não sei de onde vim
e nele habitam
o futuro e o passado...
Quando saberemos
dos motivos
dos encontros?
Eu ainda não sei, mas saiba,
eu amo você,
de todas as formas
com todas as forças
que o passado me negou
um dia!! -

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